A favela de um modo particular e os equívocos

Poeta Tulio Rodrigues


Quando ainda estava concluindo o meu segundo grau, um professor de geografia nos trouxe o tema “Favelização”. Ele queria falar um pouco de como surgiram às favelas e de como as pessoas foram morar nelas. Um tema até interessante, principalmente por trazer aos alunos o cotidiano de um lugar que tenho certeza, muitos ali nunca pisou.

O professor exibiu o documentário “Santa Marta, duas semanas no morro” de Eduardo Coutinho. O documentário é de 1987. O filme até hoje tem mais repercussão e é o mais exibido dentro das favelas.

A diferença para o que nos mostrava o documentário e o que queria nos dizer o professor, eram gritantes. O professor falava na “Favelização” de uma forma coletiva e generalizada, enquanto o documentário nos mostrava a particularidade de uma favela e de pessoas que lá viviam. Esse documentário de Coutinho não é ambíguo, é particular. Ele não conta a história das favelas de um modo geral.

Por exemplo, as pessoas que chegaram à Favela Santa Marta naquela época, diferem das pessoas que chegaram a Favela do Pinto, no Leblon e à Cidade de Deus, na Zona Oeste. Ou seja, foi um equivoco do meu professor usar esse documentário como norte do tema “Favelização”.

É claro que o documentário aborda diversos temas presentes em todas as favelas como religião, condição de moradia, sexualidade, a relação da polícia com os moradores, educação, racismo, preconceito, mas são histórias particulares e às vezes até contraditórias.

Há quem ache bom morar na favela, há quem ache ruim. É uma questão de opinião. No próprio documentário há esse tipo de visão. Isso numa época em que a condição econômica do país era ruim para as classes mais baixas. Nessa época, seria difícil encontrar na casa de um morador da favela a mesma TV que tem na casa de um morador do Leblon. Hoje isso é possível. Recentemente, o Fantástico exibiu uma reportagem em que mostrava moradores de favela afirmando que não sairiam de forma alguma da favela. Claro que há dois lados dessa moeda. Afirmar de forma generalizada que os moradores da favela não querem sair de lá é incoerente. Há favelas que deve ser boas de morar, outras não. Pergunte a quem mora numa favela dominada pelo tráfico se ele quer ficar lá. Pergunte a quem mora num barraco sem um saneamento básico adequado se ele quer ficar lá. Será que os moradores do Complexo do Alemão diriam que não querem sair de lá?

Não entendo essa maneira de querer generalizar tudo. Tanto o meu professor e o Fantástico se equivocaram, assim como tantos equívocos que surgem por aí quando o assunto é favela.

Voltando ao documentário de Eduardo Coutinho, o “Santa Marta, duas semanas no morro”, fica claro que ele em nenhum momento quis dar respostas onipresentes sobre o morador da favela e nem sobre as favelas. Os próprios trabalhos posteriores de Eduardo Coutinho nos mostra essa particularidade. Poucos sãos os seus trabalhos que foram produzidos tendo como pano um plano geral sobre um determinado assunto. Fica aqui inclusive a minha sugestão de que vejam os documentários de Eduardo Coutinho.


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Comentários

  1. Concordo com você.
    Viver com esgoto a céu aberto não é bom nem saudável para ninguém.
    Prefiro não ver este "gostar" como resignação.

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