Procurando saber - Sobre as biografias

Poeta Tulio Rodrigues


Estamos no meio de um embate cultural entre artistas, escritores, editores, biógrafos e jornalistas sobre a polêmica das biografias. Todos vêm emitindo suas opiniões em diversos veículos de comunicação. Porém, onde entra o leitor na discussão? Após ler diversas opiniões dos interessados, resolvi dar a minha opinião como leitor.

Uma biografia tem o papel de o dar ao leitor, o prazer da leitura e da informação. Essa é sua atividade fim! Não sei qual nome se dá quando você priva o leitor da informação. Biografias sobre pessoas que de alguma forma têm importância na história do país, na cultura, no esporte, na música, são essencias para a sociedade. As histórias de diversos personagens históricos se entrelaçam com a do nosso país e ajudam a compreender a sociedade. Podemos incluir os personagens principais que levantaram a discussão como Chico Buarque, Caetano Veloso, Gilberto Gil, Djavan, Jorge Mautiner, que recentemente teve um documentário lançado que podemos chamar de uma biografia audiovisual.

Confesso que no início foi difícil entender o que realmente o “Procure saber” reivindica. Principalmente pelas opiniões de seus membros. Querem direitos autorais? Censurar previamente? Discutir a questão? Tais questionamentos me levaram a deduzir que o “Procure saber” não criou lei alguma para garantir a censura prévia de biografias ou remuneração para o biografado e seus herdeiros. Por isso fiquei com a terceira questão que é discutir o direito a privacidade e a liberdade de expressão.

Agora para entender o que vem ocorrendo é simples. O Código Civil reza: 

“Art. 20 Salvo se autorizadas, ou se necessárias à administração da justiça ou à manutenção da ordem pública, a divulgação de escritos, a transmissão da palavra, ou a publicação, a exposição ou a utilização da imagem de uma pessoa poderão ser proibidas, a seu requerimento e sem prejuízo da indenização que couber, se lhe atingirem a honra, a boa fama ou a respeitabilidade, ou se se destinarem a fins comerciais.

Parágrafo único. Em se tratando de morto ou de ausente, são partes legítimas para requerer essa proteção o cônjuge, os ascendentes ou os descendentes.

Art. 21 A vida privada da pessoa natural é inviolável, e o juiz, a requerimento do interessado, adotará as providências necessárias para impedir ou fazer cessar ato contrário a esta norma.”

A ANEL (Associação Nacional dos Editores de Livros), deu entrada em 2012 numa ação no STF contra os artigos que protegem os biografados. O processo corria em segredo até o “Procure saber” se posicionar sobre o assunto e Ancelmo Góis publicar em sua coluna no O Globo. A partir daí, uma enxurrada de opiniões surgiram com os mais diversos posicionamentos. Alguns mais salutares e outros nem tanto.

A vida de Chico, Caetano, Gil, Roberto Carlos me interessam. Adoraria ler biografias sobre suas vidas, mas lhes garanto que não compro revista de fofoca para saber sobre a caminhada de Chico pela Orla da Lagoa ou algo parecido. Essa parte de suas vidas não me interessa, mas adoraria saber até onde a vida pessoal do Chico influi na sua obra, bem como a de Caetano, Gil... Como adoraria poder encontrar nas prateleiras das livrarias a biografia de Noel Rosa escrita por João Máximo, proibida pelos familiares do compositor baseado nos artigos descritos acima e a de Roberto Carlos, escrita por Paulo César Araújo, também proibido de ser vendido. Biografias de outros grandes personagens não são feitas por causa dessa lei. Imagina um biógrafo dedicando anos de sua vida numa pesquisa profunda e intensa para quando o trabalho for lançado, ou antes, o biografado ou seu herdeiro simplesmente a proibir? É um risco que ninguém quer correr e quem perde é a cultura.

É chegada a hora da Paula Lavigne vir a público e colocar de forma clara e objetiva qual bandeira o “Procure saber” levanta na questão. Nos espaços que deram a ela como no programa “Saia Justa”, da GNT, não a deixaram falar claramente sobre o que o grupo quer. O programa se tornou chato com os cortes de Barbara Gancia, colunista da Folha, que exagerou em certos momentos em suas colocações como no seu texto (Gente hipócrita) sobre as biografias.

As nossas leis que constam na nossa Constituição são muitas vezes antiquadas e nada claras. Como um país democrático, devemos e vamos discutir para que o entendimento esteja ao alcance de todos. O direito a privacidade e a liberdade de expressão se encontram num ótimo momento para serem debatidos até o projeto de lei ser votado na Câmara. E até mesmo depois da votação! Entre mortos e feridos, que a cultura e o Brasil ganhem!

Para saber mais sobre a “Batalha das biografias”: http://oglobo.globo.com/infograficos/batalha-biografias/


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