Chico Buarque estreia turnê no Rio


“Eu queria dedicar esta noite ao meu querido amigo Oscar Niemeyer”, disse Chico Buarque, num raro momento em que saiu do script, nesta quinta-feira, na estreia carioca do show “Chico”. Bons amigos, familiares, repórteres, a namorada Thaís Gulin e celebridades dos mais altos escalões não faltaram a esse evento que abre, quase que oficialmente, o calendário cultural de 2012 na cidade. Fechado o Canecão, coube dessa vez ao Vivo Rio, no Aterro do Flamengo, oferecer pouso a Chico. O palco é amplo, o som é bom, e a pista comporta, com um certo aperto inevitável, a distinta massa que acorreu ao chamado. E quem esteve lá decerto não saiu decepcionado com o que viu e ouviu ao longo de cronometrada uma hora e meia de espetáculo, que fica em cartaz até a metade de fevereiro, de quinta a domingo.

"Chico" é o show que apresenta o disco de mesmo nome, lançado no ano passado e acolhido com entusiasmo por público e critica. Mas ele começa mesmo é com “O velho Francisco”, do álbum “Francisco”, de 1988. Chico sorri, mas nada fala. Em meio ao veludo de “Desalento”, terceiro número do repertório, a plateia ensaia um coro. Mas nem precisa esperar muito, porque logo está diante de “Querido diário”, a primeira do bloco “Chico” do show — e se regozija. No entortado frevo “Rubato”, o cantor larga o violão e, meio desajeitado, vai para um lado, e depois, outro — faz parte. Alguém grita “Thaís!” e aí vêm em sequência “Essa pequena”, “Tipo um baião” e “Se eu soubesse” (“e aí, larari, larari”). Era o que todo mundo queria ouvir e cantar junto.

“Bastidores” e “Todo sentimento” (com belo piano de João Rebouças) encerram uma parte mais contida do show. Com “O meu amor”, entra em cena o Chico explodindo de feminilidade, que vai desembocar em “Teresinha” e no coral mais afinado e encorpado que se ouviu na noite do lado de cá do palco. “Anos dourados” é um daqueles sucessos dos quais não há como escapar, e “Sob medida” funciona como uma catarse, o grande momento do Chico feminino, na delícia de cuspir o “sou igual a você, eu nasci pra você, eu não presto”. Depois disso, a ordem é baixar um pouco a bola com “Nina” (a valsa russa de “Chico”) e com “Valsa brasileira”.

Um dos números que mais têm funcionado no novo show é o do resgate de “Geni e o zepelim”, do disco e espetáculo “A ópera do malandro”, de 1979. É quando o contador de histórias se anima, faz caras e bocas, interpreta, e a banda consegue extrair os comentários musicais e sublinhar as mudanças de rota da trama. O bom ânimo ainda está lá quando Chico dá um pirueta, se enrosca pelo samba e chama o baterista Wilson das Neves para dividir a cena em “Sou eu”, recente parceria com Ivan Lins. Depois da enxurrada de estrogênio, é a hora de brincar com a cumplicidade masculina, que os dois (num contraponto entre a voz bossa de Chico e a empostada de Wilson) continuam, faceiros, em “Tereza da praia”. Outro ponto alto do show.

E tudo mais se conecta em “Chico”. Do xote “A violeira”, eles vão para o baião + roque de “Baioque” e , daí, para o hip-hop-sufoco, via Criolo, da nova versão de “Cálice”. O círculo temático (Brasil, raças, periferia, relações de poder) se fecha em “Sinhá”, a faixa que encerra o disco “Chico” com tudo isso e mais um sentido de religiosidade que se expressa no ritmo dos atabaques e nos versos da canção (“Eu choro em iorubá/mas oro por Jesus”). Um tropeço (“errei a letra!”) só deixa a música mais humana. Ao fim, com o mantra percussivo ao fundo, Chico vai à frente e, logo depois, se retira.

A mensagem foi deixada, e o show poderia terminar por ali. Mas público que é público sempre quer mais, e é por isso ele volta para o bis. Depois de uma do novo disco (“Barafunda”) e de um de seus clássicos mais recentes (“Futuros amantes”) ele sai “Na carreira”, que é para avisar que, ali sim, estava se despedindo. Aquela tradicional passada pela frente do palco para tocar mãos do público, e o roteiro estava cumprido. Sob medida para a expectativa dos fãs ilustres ou não em noite de estreia.


Fonte: O Globo

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